23.
OS SETE GAÚCHOS
(fatos ocorridos entre 1965
e 1966)
A
primeira coisa que fiz, ao chegar a Roma, foi correr para
o Fórum Romano e tocar naquelas colunas. Meu Deus como aquilo
resistiu a tantos séculos? Quantos imperadores passaram sob
aqueles portais como eu fazia agora? Quando voltei para a
conhecida pensão do Largo Argentina, vi sete passaportes enormes
e verdes sobre o balcão. Só um país no mundo poderia fornecer
passaportes tão exóticos: o Brasil!
Perguntei
ao porteiro onde estavam os sete brasileiros e ele me indicou
o apartamento 107. Quando eu e meu primo Marco nos aproximamos
do corredor já escutávamos os sons característicos da batucada
brasileira. Batemos na porta e um rapaz nos atendeu. Falando
um italiano meio torto explicamos a eles, muito sérios, que
aquele som era contra as normas do "hotel". Ele nos convidou
a entrar para conversar, sentamos em uma cama e ele nos serviu
uma "birra" (cerveja) gelada.
Ele
disse, então, que compreendia e que não fariam mais barulho.
Então, em português bem claro, eu lhes disse: Se me der mais
uma "loira gelada" eu ajudo na batucada, morou? Primeiro eles
ficaram alguns milésimos de segundo espantados, mas logo depois
foi aquela explosão. Fizemos uma festa que, com certeza, manteve
a pensão acordada a noite toda. Eram sete gaúchos que tinham
acabado de formar-se em medicina e uniram-se para dar uma
volta pela Europa. Foi muita sorte tê-los encontrado, e voltar
a falar português era ótimo. Resolvemos que sairíamos juntos
para um passeio pelo sul da Itália e depois voltaríamos a
Roma (de novo), onde nos separaríamos.
Tomamos
um trem e logo percebi que meu primo Marco Antônio havia se
transformado em um especialista em trens europeus, que são
bem diferentes dos nossos. Os vagões são formados por compartimentos
e cada compartimento é uma espécie de sala, com dois sofás
de três lugares de frente um para o outro. Além disto os compartimentos
apresentavam uma grande janela para fora e uma porta e duas
janelas pequenas para o corredor.
Como
era por estas janelinhas que os passageiros observavam a lotação
do compartimento, o Marco tratava de fecha-las. Para aqueles
mais insistentes que abriam a porta para conferir, o Marco
começava a tossir uma tosse de cachorro e o cara, com medo
de ser alguma doença contagiosa, caía fora. Nós dávamos boas
risadas destes europeus ignorantes! O motivo disto tudo é
que, se fôssemos sozinhos no compartimento, à noite poderíamos
transformar os sofás em camas e dormir com todo conforto e
tranqüilidade. Desembarcamos, os nove, em Pisa e corremos
para conhecer a famosa Torre de Pisa, antes que ela caísse!
É difícil subir naquela torre, porque a escada é interna e
não tem corrimão nem proteção alguma. Você corre o risco de
ficar tonto e despencar lá de cima.
Quando
pisava, cheio de orgulho, o último degrau, levantei os olhos
e vi, no portal do terraço, grosseiramente escrito a lápis,
o nome "BRASIL". Jesus Cristo, que vergonha, peguei
uma borracha que levava no bolso (eu gostava de fazer anotações
sobre a viagem, mas as perdi) e apaguei aquele absurdo. Mas
a torre é linda e impressionante. De Pisa fomos a Florença,
onde confirmamos que na Itália a pechincha faz parte da Constituição.
O
dono de uma carruagem começou cobrando vinte dólares por um
passeio e acabou aceitando fazê-lo por cinco. Foi um passeio
inesquecível e nos divertimos a valer. Para mim Florença é
muito especial, foi de lá que partiu um "Cavalcanti" que viria
a formar minha família no Brasil. Além de ser uma das mais
belas cidades da Itália, Florença é a guardiã de um grande
tesouro cultural.