25. A SURPRESA SUÍÇA
(fatos ocorridos entre 1965 e 1966)

          Tomamos o trem para Genebra, na expectativa de vê-lo serpentear pelos Alpes italianos mas, ao contrário do que esperávamos, o trem passou direto por baixo dos Alpes, atravessando o maior túnel ferroviário do mundo, sob o Mont Blanc. Ao sair do interminável túnel, o trem parou em uma pequena estação de fronteira, como sempre fazia, para que nossos passaportes fossem carimbados.

          Os agentes federais da alfândega suíça entraram no trem pelo primeiro vagão e vieram conferindo os passaportes. Quando apresentamos os passaportes a dois deles, seus olhos arregalaram e, depois de trocarem um olhar afirmativo, nos falaram uma frase em um italiano incompreensível. Como não entendemos o que diziam começamos a tentar uma conversação em inglês. Eles ignoraram nossa conversa e nos puxaram educadamente para fora do trem, até a estaçãozinha.

          Nós estávamos apavorados, E se nos prenderem em um país onde nem conseguimos entender o que falam? Ao chegarmos à estação, um dos agentes falou algo a um sujeito sentado em uma mesa. Devia ser o chefe dos agentes. O chefe tentou nos interrogar, mas não entendíamos bulufas. Quando tentamos falar em inglês o tal chefe mandou chamar um dos agentes que, pelo jeito, devia falar inglês. Quando este agente chegou nós despejamos uma saraivada de perguntas sobre ele, tentando saber o que acontecia, antes que o trem partisse sem nós, levando nossas malas.

          A primeira frase do agente foi: Vocês estão detidos! De repente ficou tudo escuro, fiquei meio tonto e meu coração insistia em pular para fora, pela minha boca. Com muito custo meu primo, que devia estar sentindo a mesma sensação, perguntou: Detidos porque? Será que o governo militar do Brasil havia mandado nos deter? Será que éramos sósias de criminosos famosos? Será que alguém nos denunciara só para rir de nós? Será que transportávamos drogas sem o saber? Será que era proibida a entrada de brasileiros na Suíça?

          Mais de mil perguntas surgiram em um décimo de segundo na minha cabeça. Depois de ler uma ficha que o tal chefe lhe fornecera. o agente nos disse: Seus pais acionaram a Interpol (Polícia Internacional) porque há meses vocês não se comunicam com eles e eles temiam que vocês tivessem sido raptados ou mortos. Nossos próprios pais mandaram que nos prendessem? Não dava para acreditar naquilo... O fato é que, por motivos econômicos, não havíamos telefonado ou escrito nestes últimos meses. Então perguntei ao agente o que faria conosco.

          Ele respondeu que tinha ordens de nos conduzir a Roma, onde nos colocaria em um avião para o Brasil. Nossa, era sério mesmo! Acabamos fazendo um trato com os agentes, nós continuaríamos a viagem, visto que a Dorinha nos aguardava em Genebra, e de lá seguiríamos direto para o Brasil. É obvio que não cumprimos, precisávamos aproveitar aquela oportunidade única e conhecer a Europa. Uma vez no trem, ficamos meia hora olhando um para a cara do outro ainda sem acreditar no que ocorrera. Combinamos que, ao chegar a Genebra, nossa primeira ação seria fazer um interurbano para avisar nossos pais de que estávamos bem e pedir para que eles tirassem os agentes da Interpol de nossos calcanhares.



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