26. A CABINE TELEFÔNICA
(fatos ocorridos entre 1965 e 1966)

          Depois de uma breve estada na famosa cidade de Lausanne, chegamos a Genebra. Logo de cara um fora, tivemos que ser acordados pelo cabineiro porque dormíamos a sono solto e não percebemos que o trem havia chegado a seu destino. No guichê de câmbio da estação trocamos nossas liras que sobraram por francos suíços e na porta da estação tomamos um bonde. De repente começou a cair uma forte chuva.

          Na poltrona ao lado ia um suíço lendo um jornal em alemão. Não conseguia entender nada. De repente o suíço desceu do bonde e o Marco pediu para que eu pegasse o jornal. Perguntei-lhe, então, para que queria um jornal em alemão. Ele me respondeu, sorrindo, que era para se abrigar da chuva. Às vezes sua inteligência me aborrecia profundamente, mas peguei o jornal e, pegando um caderno para mim, entreguei-lhe o resto.

          Descemos no ponto que nos havia sido indicado e chegamos em frente ao pensionato de moças da Dorinha. Eram quase dez horas da noite e estava tudo fechado! Batemos na porta, gritamos, pulamos, mas nada, todos dormiam. Andamos pelas redondezas até acharmos uma cabine telefônica. Ligamos várias vezes, mas ninguém respondia. E agora, onde iríamos dormir?

          Dinheiro para hotel nem pensar! Ficamos ali, na cabine telefônica, com as portas fechadas, porque lá fora o frio estava batendo nos dez graus negativos, pensando numa forma de contatar a Dorinha sem acordar o quarteirão todo. De repente pensamos, porque não dormir na cabine, ela era espaçosa e quentinha, bastava deixarmos a porta um pouco aberta para apagar a luz. Nos sentamos no piso atapetado da cabine e acordamos com uma velha gorda enorme chutando nossos pés para que acordássemos, ela queria telefonar.

          Tivemos que correr para escapar de seu guarda-chuva. Fomos para o pensionato da Dorinha e desta vez, depois de muito bater e gritar fomos atendidos e conseguimos entrar. Dorinha nos serviu um café quente e nos deixou descansar em um sofá até amanhecer. Pela manhã Dorinha nos levou até a Cidade Universitária, onde nos hospedamos a preço de banana por sermos estudantes. Tomei um banho, troquei de roupa e desci para tomar um refrigerante na cantina.

          Pedi em inglês e fui atendido, mas o cara me olhava com curiosidade. Logo me perguntou de onde eu era, respondi orgulhoso que era do Brasil. Ele fez uma cara feia e disse em inglês: Brasil, bangue-bangue, meu tio morreu lá, quando visitava o Rio de Janeiro. Fiquei uma fera. O maldito tio dele tinha que bater as botas justamente no Brasil? Falei para ele que da próxima vez que ele me falasse que o Brasil era bangue-bangue, eu daria um tiro nele!

          O coitado ficou branco e não abriu mais a boca, só de me ver já ficava pálido. Depois fomos conhecer a cidade com a Dorinha. Ela nos levou à Universidade onde estudava Psicologia e nos apresentou a seu mestre, um velhinho muito simpático chamado Piaget. Conversamos por algum tempo, ele queria saber sobre nossas aventuras e sobre o Brasil. Bom velhinho. Só depois de muitos anos que fui descobrir que aquele velhinho era Jean Piaget, o papa da Psicologia Infantil.

          Depois deixamos a Dorinha entregue a seus estudos e saímos a pé pela cidade, como estávamos acostumados. Genebra é uma cidade linda e muita bem cuidada, me encantei com um relógio todo de flores no centro da cidade e com o lago. Se tentasse colocar um defeito naquela cidade isto me daria um trabalhão. A Dorinha pediu a um amigo português, que tinha um carro, para nos levar para conhecer as montanhas e as pequenas cidades da região, foi um dos bons passeios que fizemos. No retorno a Genebra contornamos boa parte do lago e paramos para ver o esguicho, como é alto! Ao entrar no centro da cidade paramos para tomar um gostosíssimo chocolate quente, a Dorinha demonstrou ter um coração maior que a Suíça.



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